O estudo liderado por um epidemiologista da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL) inclui 28 meta-análises e será publicado na revista The Lancet. O aleitamento materno também reduz o risco de obesidade e diabetes.

A mais ampla e detalhada pesquisa já realizada no mundo sobre amamentação, coordenada por um cientista gaúcho, revela dados impactantes sobre a importância do aleitamento materno para a saúde e a economia. De acordo com o estudo, que será publicado hoje pela revista médica The Lancet, universalizar a amamentação evitaria a cada ano a morte de 800 mil crianças e de 20 mil mulheres vitimadas pelo câncer de mama. Conforme o trabalho, a falta de amamentação causa um prejuízo anual de US$ 302 bilhões, por limitar o desenvolvimento intelectual — são US$ 8,7 bilhões perdidos apenas no Brasil.
O principal autor do estudo é o epidemiologista Cesar Victora, professor da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e um dos cientistas brasileiros de maior projeção. Ele foi convidado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) a comandar o grupo internacional que cruzou dados de 28 pesquisas já realizadas sobre o tema — 22 delas encomendadas especificamente para a The Lancet.
As 800 mil vidas que seriam poupadas a cada ano pelo leite materno correspondem a 13% da mortalidade nos primeiros 24 meses de vida. Apesar desse impacto em potencial, o trabalho mostra que a amamentação é negligenciada. Apenas uma em cada cinco crianças recebe leite materno até os 12 meses nos países de renda alta. Em países de renda baixa ou média, como o Brasil, o aleitamento exclusivo até os seis meses é privilégio de apenas uma em cada três crianças.
Uma das descobertas mais importantes da pesquisa é que a amamentação não faz bem apenas para a saúde de quem recebe o leite, mas também de quem o fornece. Os dados apontaram menor incidência de câncer de mama e de ovário entre as mulheres que dão o peito. Segundo Victora, isso decorre do efeito hormonal decorrente da estimulação do seio pelo bebê (veja entrevista ao lado).
No caso das crianças, o aleitamento aumenta a inteligência e reduz o risco de desenvolvimento de obesidade e diabetes na idade adulta. Nos países de alta renda, a mortalidade infantil súbita cai um terço entre crianças amamentadas. No países mais pobres, previnem-se metade dos casos de diarreia. A expectativa de vida de quem foi aumentado é maior.
Conforme os autores do trabalho, o aumento das taxas de amamentação de crianças de até seis meses de idade a 90% nos Estados Unidos, na China e no Brasil e a 45% no Reino Unido reduziria os custos com tratamento de doenças como pneumonia, diarreia e asma. A economia para os sistemas de saúde seria de US$ 2,45 bilhões nos EUA, US$ 29,5 milhões no Reino Unido, US$ 223,6 milhões na China e US$ 6 milhões no Brasil.
A pesquisa mostra que a falta de aleitamento materno é um problema especialmente grave em países ricos. Por razões culturais ou de mercado de trabalho, as taxas são baixíssimas no primeiro ano de vida em nações como o Reino Unido (menos de 1%), a Irlanda (2%) e a Dinamarca (3%). Os pesquisadores observam que a amamentação é um dos poucos comportamentos de saúde positivos que é mais comum em países pobres do que nos ricos.
Os responsáveis pelo estudo manifestam uma preocupação especial com o avanço da indústria que oferece produtos para substituir o leite materno — as vendas globais do setor passaram de cerca de US$ 2 bilhões em 1987 para US$ 40 bilhões em 2014.
— A saturação de mercado em países de alta renda leva as indústrias a penetrar rapidamente em mercados globais emergentes. Quase todo o crescimento em vendas de leite em fórmula para crianças no futuro próximo deve acontecer em países de renda baixa e média, onde o consumo ainda é relativamente baixo — alerta um dos autores, Nigel Rollins, do Departamento de Saúde Materna, Neonatal, Infantil e do Adolescente da OMS.
• BENEFÍCIOS PARA AS CRIANÇAS AMAMENTADAS POR MAIS TEMPO:
Menos infecções;
Inteligência maior;
Menor risco de obesidade;
Menor risco de diabetes;
Entre outros.
Fonte: Zero Hora